Isolador para Linhas Telegráficas

No mesmo ano em que, no Rio de Janeiro, nascia o segundo Imperador do Brasil, na freguesia de Antônio Pereira, município de Mariana, então província de Minas Gerais, vinha ao mundo, aos 17 de janeiro de 1825, Guilherme Schuch, futuro Barão de Capanema. O menino era filho dos austríacos, Roque Schuch, professor do Museu Nacional de Viena e integrante da comitiva da Princesa Leopoldina, e, de Josephina Roth. Roque havia sido nomeado em 1839, professor de italiano e alemão do futuro Imperador e das princesas. Um ano antes, o jovem Guilherme partira para a Europa, aos cuidados do Visconde de Barbacena, para estudar engenharia. Em Munich, teve intenso contato com Spix e Martius, naturalistas empenhados naquela célebre peregrinação científica pelo Brasil, nos anos dez dos oitocentos. Guilherme concluiu o curso de engenharia na Escola Politécnica de Viena.



Segundo o historiador José Murilo de Carvalho, Guilherme Schuch Capanema, filho de Roque Schuch, professor de alemão e italiano do monarca, como falava alemão, foi mandado para Áustria. Tinha relação quase fraternal com D. Pedro, de quem fora amigo de infância e exerceu papel relevante na promoção da ciência brasileira. Mas deu grandes prejuízos a seu protetor pela incapacidade de controlar gastos. De volta ao Brasil, com todas as credenciais que a moderna formação científica lhe permitia, não teve dificuldade em se realizar profissionalmente. E é assim que, auspiciado pelo Imperador, de quem fora sempre devotado amigo, funda na Corte, aos 11 de maio de 1852, o Telégrafo Nacional, do qual foi o primeiro e eterno diretor. A repartição funcionou, no Campo de Santana, atual Praça da República, no local que abriga hoje o quartel do Corpo de Bombeiros. A escalada da implantação dos fios telegráficos no Brasil deu-se, conforme a índole monárquica, de maneira lenta, gradual, e segura. Em 1855 teve início a construção de uma linha do Rio para Petrópolis, em agosto de 1858. 

O jornal “O Parahyba” que então se editava nestas serras, na seção de anúncios, localizada na 3ª página da edição de 12 de agosto de 1858, estampava: “O Dr. Guilherme Schuch de Capanema, diretor dos telégrafos elétricos, manda fazer público que se acha aberta todos os dias a comunicação telegráfica de Petrópolis para a cidade; por isso, todas as pessoas que quiserem transmitir suas notícias, poderão dirigir-se à mesma estação. Petrópolis, 7 de agosto de 1858 – Estacionário José Francisco de Mattos”. Em 1870, São João da Barra já havia sido atingida pelo fio telegráfico. No rumo do sul do Império, já estavam construídos, ao término da Guerra contra o Paraguai, o prolongamento de Pelotas a São João de Camaquan e o ramal de Paranaguá a Morretes. Em 1874, a linha terrestre chegou a Vitória, Salvador e Aracajú; em 1875, à Paraíba; em 1876, à Natal e, em 1881, à Fortaleza.

Segundo Edgard B. de Barros, na conferência realizada em 1º de outubro de 1936, na Sociedade de Amigos de Alberto Torres, sobre o Barão de Capanema, das 20 províncias do Império, 13 já se achavam ligadas pelo telégrafo no limiar dos anos 80 dos oitocentos. Em 1884, a linha chegou a São Luís do Maranhão. Depois ligou se em Jaguarão, o telégrafo brasileiro ao uruguaio e finalmente ao argentino, pondo em contato direto o Rio de Janeiro e Buenos Ayres. Depois de incontestáveis serviços prestados à comunicação no Brasil, Guilherme Schuch, Barão de Capanema desde 1881, sentiu que estava na hora de aposentar-se, o que acabou lhe acontecendo compulsoriamente, por força do novo regime implantado a 15 de novembro de 1889. Afastando-se da vida publica e sempre fiel a D. Pedro II e a seu ideário, seguiu dedicando-se às atividades intelectuais, até que a morte o colhesse em 1908, aos oitenta e três anos de idade. Parece incrível, que o cinquentenário da implantação do telégrafo elétrico no Brasil, ocorrido em 1902, somente tenha sido festejado em 1904, já no governo Rodrigues Alves. Foi desprezo demais, por um tema de tamanha magnitude.

Doutor em engenharia pela Escola Militar do Rio de Janeiro, professor de Física e de mineralogia do Museu nacional e da Escola de Engenharia e da Escola de Engenharia, Capanema foi também um dos mais notáveis engenheiros brasileiros do século XX e de atuação quase enciclopédica em vários campos. Como professor distinguiu-se pelo caráter prático e experimental que dava aos cursos. 

O telégrafo foi a internet vitoriana. Cento e cinquenta anos atrás, foi introduzido o telégrafo elétrico no Brasil. Antes, havia apenas algumas instalações de telegrafia ótica que faziam ligações entre fortalezas e faróis em portos brasileiros. Em 11 de maio de 1852, sob a direção de Guilherme Schuch de Capanema, inaugurava-se a nossa linha telegráfica, que ia da Quinta Imperial ao Quartel do Campo, no Rio, com 3 km de linha subterrânea. Capanema havia se formado na Escola Politécnica de Viena. Para colocar os fios, ele teve a ajuda de prisioneiros da Casa da Detenção. A motivação inicial do Ministério da Justiça para determinar a instalação dessa linha parece ter sido o combate ao tráfico de escravos. Em 1855, Capanema foi nomeado Diretor Geral dos Telégrafos, cargo que ocupou até a queda do Império, exercendo forte influência junto a D. Pedro II. Após a primeira linha, o telégrafo começou a se estender pelo país, inicialmente para o Sul, atendendo às necessidades militares da Guerra do Paraguai. Uma estação de manutenção e uma pequena fábrica para construir equipamentos foram criadas por Capanema em 1865 no Rio. Após esse período, as linhas telegráficas passaram a crescer rapidamente em direção ao norte e interior do país, numa epopeia que duraria até o primeiro quartel do século 20, em particular com os trabalhos de Rondon e sua equipe. 

A ligação telegráfica entre as cidades da costa brasileira e do Brasil com a Europa foi realizada, em 1873 e 1874 respectivamente, por meio de cabos submarinos de companhias inglesas. Curiosamente, o grande físico inglês William Thomson (Lord Kelvin) e seu colega Fleeming Jenkin eram os engenheiros da companhia que colocava os cabos e supervisionaram a instalação do cabo entre Recife e Belém. Diversas disputas ocorridas entre as companhias inglesas e a diretoria dos telégrafos ao longo do século 19 anteciparam muito da disputa entre o estatal e o privado existente hoje. Uma interessante controvérsia técnica, política e econômica envolvendo Thomson e Jenkin com Capanema sobre a colocação do cabo submarino em São Luís (MA) ocorreu nos anos 1870. A Western and  Brazilian Telegraph Company havia solicitado ao governo a dispensa de construção de uma ligação do cabo submarino para São Luís, na linha Recife-Belém. Capanema recusou a proposta britânica. Na disputa que se seguiu, Thomson, Jenkin, outros engenheiros da companhia inglesa e uma comissão brasileira, por um lado, e Capanema e outros engenheiros brasileiros, pelo outro, produziram relatórios em oposição. A pendenga estendeu-se de 1873 a 1876, quando uma expedição da marinha brasileira foi enviada ao local para fazer medidas e concluiu pela possibilidade técnica de se construir a ligação, o que a companhia inglesa teve de realizar. 

Outro fato interesante foi a invenção, por Capanema, de um novo isolador para as linhas telegráficas terrestres. Devido às condições ambientais nos trópicos (calor e alta umidade) a deterioração rápida dos isoladores era um problema grave para as linhas. Isso levou Capanema a inventar um novo tipo de isolador, todo feito de vidro, porcelana, ebonite etc., mas que não usava peças metálicas. Essa invenção recebeu a patente número 4171, em 1873, no Reino Unido e foi divulgada nas principais revistas europeias da área. Esse isolador foi usado no Brasil e temos a informação (que precisa ser confirmada) de que teria sido usado também na grande linha telegráfica da Índia. Se assim for, este será um exemplo interessante de transferência tecnológica entre países da periferia, em um domínio tecnológico em que havia ampla hegemonia do Império Britânico. 

Além desse cargo e de suas atividades de professor, Capanema realizou muitos outros empreendimentos, como a reconstrução da Fábrica de Pólvora da Estrela, a construção de primeira fábrica de papel do Brasil, aproveitando uma queda d’água na Serra de Petrópolis. Empregou a primeira turbina hidráulica na América do Sul. Reorganizou também a Fábrica de Ferro de Ipanema, projetou e construiu os armazéns da Alfândega no Rio de Janeiro e chefiou a Seção de Geologia da Comissão Científica de Exploração, onde realizou importantes pesquisas geológicas e paleontológicas no Nordeste. Inventou também uma grelha especial para facilitar a escrita dos telégrafos, uma máquina para pulverizar e a substância química necessária para matar formigas (saúva), substância esta que levava seu nome e que ficou famosa, e para a qual construiu uma grande fábrica na Ilha do Governador. Participou da Comissão Científica de Exploração, da instalação das primeiras estações meteorológicas no Brasil e presidiu a comissão de introdução do sistema métrico decimal no Brasil. Foi, ainda, um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Estatística e do Instituto Politécnico Brasileiro.

Fonte: 
http://www.uol.com.br/cienciahoje/chdia/n606.htm 
http://sbf.if.usp.br/WWW_pages/Journals/Fne/Vol2/Num2/a07.pdf 
http://www.ihp.org.br/docs/fjrv20020719.htm 
http://planeta.terra.com.br/educacao/projetovip/0117.htm 
acesso em maio de 2003
História da Engenharia no Brasil, sec XVI a XIX, Pedro Telles, Segunda Edição, Clube de Engenharia, página 560 e 574 
d. Pedro II, josé Murilo de Carvalho, Cia das Letras, 2007, p. 99 

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